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antoniodesousa

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Amigos! Eis aqui o dos olhos de mel! O Poeta!

.MJoão Sousa

Cria o teu cartão de visita

A DERRADEIRA MORTE DO ENCANTADO


Maria João Brito de Sousa

11.09.08

 

O senhor-dos-óculos-pretos disse: Morreu!

Mas aquela rapariga meia-maluca

fêz-lhe uma coroa de flores

e beijou-o devagar.

Ele estava deitado, voltado para o céu,

vivo ou morto - a sonhar.

 

Passou um dia enorme.

O senhor-dos-óculos-pretos disse: Cheira mal!

(as abelhas bem sabiam que não

e diziam baixinho: -Dorme...

poisadas sôbre o seu coração.)

 

O senhor-dos-óculos-pretos disse: À cova!

Mas nem os coveiros ouviram.

A chuva mansa lavou-lhe o rosto

e colou-se-lhe ao corpo a lua-nova,

depois da benção so sol-pôsto.

 

(Do senhor-dos-óculos-pretos ninguém sabe.

Mas Êle, para sempre, ali ficou,

a dormir e a sonhar, com o mesmo sorriso.

- Há tanta coisa que não cabe

senão no Dia do Juízo!...)

 

In - "O Náufrago Perfeito" , Tipografia Atlântida

       Coimbra, 1944

 

Imagem - Fotografia gentilmente cedida por "Fisga"

               http://planeta-sol.blogs.sapo.pt/

 

CONFISSÃO


Maria João Brito de Sousa

10.09.08

- Quem chama sonho a êste mêdo à vida?

- O que sabeis da luz, olhos fechados?

Ao que passa com passos renegados

Nem a morte perfeita é concedida!

 

Anjo? Demónio? Terra prometida?

Saudade duns deuses inventados?

Oh alma! Na balança dos pecados

O que importa, ao chegar, é a despedida!

 

Sai das portas do abismo um fumo lento:

Abre as veias de fogo o pensamento

(O céo nega e promete a madrugada...)

 

E o fôgo vai - ou vem? - à sua guerra!

Mas eu devoro em mim o céo e a terra:

Eu ou sou esta fome ou não sou nada!

 

Retirado de um recorte de jornal impossível de identificar. Pela ortografia penso poder afirmar tratar-se de um poema da juventude do poeta, provavelmente do início da segunda década do século XX.

 

POEMAS DE ANTÓNIO DE SOUSA (por Campos de Figueiredo)II


Maria João Brito de Sousa

09.09.08

"Meu fato lunar confuso/e o meu sonho mais profundo"

... "Fato lunar" e "sonho". Isto é a ironia, o "humour" de que o Poeta se serve para fora, e o "sonho". Sancho Pança e D. Quixote, ou antes - e nisto consiste a sua verdadeira originalidade - a unificação, a integração de Sancho em Quixote.

Sancho a rir-se do Cavaleiro da triste figura.

Desta simbiose peninsular, desta mistura de inteligência com loucura, saiu a poesia do encantado, pretendendo desencantar-se, coçando a caspa lírica.

Ah, a luta da inteligência com o seu destino de Poeta!

Ela já se previa no primeiro poema da "Ilha Deserta" e amplia-se, agora, neste livro.

Não se suponha contudo que apesar da sua mocidade, da sua dissemelhança exterior com os livros precedentes, "Sete Luas" não está tocado do mesmo fatalismo lusíada. Não do fadeco das alfurjas, mas do nosso fatum, do nosso cruzar de braços diante das forças do destino, sem um impulso heróico para o vencer. Daí o drama do Poeta: a certeza lúcida desse destino e a sua imaginada incapacidade para o dominar. Nascer Poeta foi uma fatalidade. E agora?

Degredado em si mesmo, chorando, embora, a sua "irona lírica".

É essa ironia que abre os alicerces deste livro e levanta a sua cúpula.

Por isso "Sete Luas" se apresenta com uma unidade, uma repetição temática tão harmónica e consequente, que bem lhe poderia António de Sousa chamar POEMA em vez de POEMAS.

 

Nasço com esses que hão-de herdar a terra

Onde só temos, de certeza, a cova.

..................................................................

Famintos cães uivando em descampados

Sou os que traçam versos delirando,

Cheios de frio, inúteis, desgraçados.

Queimo o incenso da preces que não passa

As nuvens do segredo.

E sou dos que andam à divina Graça

No meu degredo.

 

Segunda e última parte do artigo de Campos de Figueiredo.

 

SETE LUAS -(Poemas de António de Sousa) por Campos de Figueiredo


Maria João Brito de Sousa

07.09.08

Nesta maré montante de publicações cotidianas, é natural que um livro de sinal positivo passe despercebido ao leitor mal informado.

...Quando se fizer, um dia, uma revisão de valores, quando tiverem desaparecido os "críticos" ressentidos e despeitados, quando aparecer "Alguém" que só conheça as obras, independentemente dos autores, ficará meia dúzia de nomes respeitáveis e sérios. António de Sousa fará parte dessa pequena colheita.

É que existem na sua obra de Poeta alguns poemas com a qualidade e a marca da Grande Poesia.

O que tem prejudicado a divulgação mais ampla do seu nome é precisamente aquilo que, no futuro, há-de torná-lo grande entre os raros: - a sua incapacidade de literato!

António de Sousa é a negação do literato. Homem-Poeta acima de tudo, só quando o seu rio transborda e a nacessidade de comunicação se lhe impôe, é que os versos saem. Saem como a água das rochas. Nascem como plantas bravas. E bravas ficam quase sempre. Ele não se dá ao trabalho de jardinar.

Por isso, o que da sua Poesia se projectar para o futuro, é porque já lhe pertence, como a primeira estrela do céu e a primeira onda do mar.

Só esta inconformidade com o literato explica a sua falta de contacto mais frequente com o leitor.

António de Sousa não faz versos. Quando eles lhe nascem lá dentro, atira-os como quem sacode sangue que lhe rebentasse nas mãos.

Ah, leitor desprevenido, se leres este livro novo, "Sete Luas", ficarás espantado! Como é que um poeta que já cantou ao sabor do fácil sentimento lusíada, te dá esta coisa aluada, maluca de todo, com o seu sabor demiúrgico, este livro estranho na nossa literatura poética, repassado de amargo sarcasmo, de trágico humor, de ironia dilacerante?

A chave de "Sete Luas" está apenas em dois versos:

Meu fato lunar confuso

e o meu sonho mais profundo.

 

(Continua)

 

NOTA - Um artigo de Campos de Figueiredo, num jornal que não está identificável porque o "herdei" em recorte. Data de 1943.

VERSOS DE UM DIA DOENTE


Maria João Brito de Sousa

06.09.08

E sou eu afinal êste farrapo?

Que é dos meus olhos de menino-e-moço?

É isto só o coração, que eu ouço,

Aos pulos, no meu peito, como um sapo!?

 

Oh voz fadada pra falar de Deus,

Deixaste-me na bôca cinza apenas!

São estas mãos aquelas mãos pequenas

Que minha mãe erguia para os céus?

 

Já não sou, meu amor, o que tu amas.

- Esse a quem deste as tuas mãos leais

- Há que tempos morreu! - não volta mais:

Veiu o Diabo e atirou-o às chamas!

 

Hoje sou, na verdade, êste senhor

De falas mansas, a viver baixinho...

Roubaram-me de noite, no caminho,

A alma que me deu Nosso-Senhor!

 

In- PRESENÇA - Nº3

     Fôlha de Arte e Crítica

     Coimbra, 8 de Abril de 1927    

A NOVA MORTE DE O ENCANTADO


Maria João Brito de Sousa

04.09.08

Era a noite de toda a gente,

púlpito de anjos e de espectros

para ele e esses dois metros

do seu catre... um Oriente!

 

O toar da velha guitarra

dos nervos em que os avós

se lhe aguaram - a foz

onde os navios quebraram a amarra.

 

Os seus óculos banais

- um Olimpo a dois postigos

por onde uns deuses amigos

coavam versos imortais.

 

Suas mãos, com cinco dedos

como as que pegam nas enxadas,

eram asas embruxadas,

teares de líricos segredos.

 

A boca - chamas e crisol

da própria forja da beleza-

pregava ao mundo uma certeza

toda de caminhos de luar e sol.

 

Até os pés - prosaicos pés

nos sapatos quarenta e um-

eram-lhe para andar desertos em jejum

como os do povo santo de Moisés.

 

Enfim, senhores! Hoje seria

de todos o maior desde as origens,

se não tivesse a mania

de amar impuras e virgens.

 

 

In - "Sete Luas", 2º edição, Editorial Inquérito, 1954

QUESITO


Maria João Brito de Sousa

03.09.08

 

 

 

- Ó flor,

quem te quer mais?

Este secreto sonho que me rói

e em poemas lavra terra e nuvens,

ou a paz que te deu,

amiga, a Vida,

nos beijos de outro, simples e leais?

 

(A quotidiana paz, longe de versos,

de demónios e de anjos

pintados de sorrisos e de lágrimas,

de saudades e rezas.

A quotidiana paz, longe de versos,

de mordidos desejos como chamas

e de meigas ternuras enleadas.)

 

- Quem te quer mais, amor?

(Escolha o céu por ti,

por nós,

que esta dor que me corta é eu saber

que não sabemos escolher!)

 

 

In - "Terra ao Mar", Editorial inquérito, 1954

 

Na fotografia - Cactos no meu atelier

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