COMUNICADO
Maria João Brito de Sousa
06.07.09
Depois de amanhã vou para a Lua,
A cavalo num peixe voador.
(Ando com insónias há cem anos
E tenho medo dos aviões.)
Depois de amanhã vou para a Lua.
Amanhã há impedimentos:
Preciso de escrever umas cartas
E ainda não acabei o tabaco de cachimbo.
Depois de amanhã vou para a Lua.
Recebi um bilhete do Anjo Azul:
“Compadre, tenho estrelas para o jantar…”
(Sempre gostei de estrelas
E, agora que estou a ficar velho,
A carne da Terra faz-me mal.)
Depois de amanhã vou para a Lua.
Rua do Raio Verde, 7, rés-do-chão.
(O quarto de hóspedes tem grades
E entra-se por um alçapão.)
Depois de amanhã vou para a Lua.
Não tenciono cá voltar.
Deixo à família um bom espólio:
Meu lugre-escuna – ou é falua? –
Que anda de cor por terra e mar,
O meu roteiro e o seu escólio:
Quinhentos versos a secar.
In “Linha de Terra”, Lisboa, 1951
Imagem retirada da internet