MAR MORTO
Maria João Brito de Sousa
06.04.08
Vida!
Ao destino dos homens
que mais sou eu para a amar
com esse amor impossível
que me abrasa e me regela
- onda rolada na alma,
prece nos olhos e sonho
em mim todo -
que me redobra e me toa
como um bordão em espasmos?
.
Que noite em mim quer ser dia
e que inferno ser o céu?
.
Porque se prendem a ti,
ó mão das minhas quimeras,
as mãos que pedem esmola,
as asas frustres, sem voo,
os cegos
e os desprezados
nas sombras dos seus pecados?
Almas e coisas que suam
sua mudez condenada,
porque me escolhem a mim
para eu falar por elas;
para que as diga esta voz
só de palavras quebradas
como lanças na derrota?
.
Menino-Desconhecido,
Senhor Deus! Quem me conhece
e me lavrou a sentença?
.
"Tu, desertor cobarde e mentiroso,
porque entregaste sem timbre
em feitiços de amor o teu condão?
Estrela de papel,
mago pintado em "clown",
histérico bufão,
vulcão de lodo,
de ti queremos apenas
a tua confissão.
.
A tua outra verdade
como o resto... é só vaidade.
Sim! Conhecemos-te bem,
traidor nosso e nosso irmão!"
.
In - Livro de Bordo, 1ª edição,
Editorial Inquérito, Lisboa, 1950