POEMAS DE ANTÓNIO DE SOUSA (por Campos de Figueiredo)II
Maria João Brito de Sousa
09.09.08
"Meu fato lunar confuso/e o meu sonho mais profundo"
... "Fato lunar" e "sonho". Isto é a ironia, o "humour" de que o Poeta se serve para fora, e o "sonho". Sancho Pança e D. Quixote, ou antes - e nisto consiste a sua verdadeira originalidade - a unificação, a integração de Sancho em Quixote.
Sancho a rir-se do Cavaleiro da triste figura.
Desta simbiose peninsular, desta mistura de inteligência com loucura, saiu a poesia do encantado, pretendendo desencantar-se, coçando a caspa lírica.
Ah, a luta da inteligência com o seu destino de Poeta!
Ela já se previa no primeiro poema da "Ilha Deserta" e amplia-se, agora, neste livro.
Não se suponha contudo que apesar da sua mocidade, da sua dissemelhança exterior com os livros precedentes, "Sete Luas" não está tocado do mesmo fatalismo lusíada. Não do fadeco das alfurjas, mas do nosso fatum, do nosso cruzar de braços diante das forças do destino, sem um impulso heróico para o vencer. Daí o drama do Poeta: a certeza lúcida desse destino e a sua imaginada incapacidade para o dominar. Nascer Poeta foi uma fatalidade. E agora?
Degredado em si mesmo, chorando, embora, a sua "irona lírica".
É essa ironia que abre os alicerces deste livro e levanta a sua cúpula.
Por isso "Sete Luas" se apresenta com uma unidade, uma repetição temática tão harmónica e consequente, que bem lhe poderia António de Sousa chamar POEMA em vez de POEMAS.
Nasço com esses que hão-de herdar a terra
Onde só temos, de certeza, a cova.
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Famintos cães uivando em descampados
Sou os que traçam versos delirando,
Cheios de frio, inúteis, desgraçados.
Queimo o incenso da preces que não passa
As nuvens do segredo.
E sou dos que andam à divina Graça
No meu degredo.
Segunda e última parte do artigo de Campos de Figueiredo.